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ARTE ETC
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ARTE : UM POUCO

 

            A palavra ARTE para nós vem do Latim arte[m] - ars, artis no dicionário - e nem sempre teve a acepção que hoje é corrente: de um universo que participa da cultura (arte não é natural, mas cultural) corporificando-se por meio das obras-de-arte, que são mensagens especialmente elaboradas para atender a necessidades de nossa psiqué. Tais mensagens (que se nos apresentam em forma de pinturas corporais ou rupestres, dança, música, poemas etc) são portadoras de informação estética (e a palavra ESTÉTICA vem de um verbo grego que significa "perceber através dos sentidos").
            Porém, não são apenas as obras-de-arte que trazem informação estética, só que o que elas trazem roçam o campo do admirável. A Arte se localiza no território do inútil-essencial. Ou seja, não tem utilidade prática, mas alimenta o espírito - por mais gasta que esta metáfora possa estar-parecer. (A palavra grega que mais se aproxima do que entendemos por arte é TÉCHNE, donde vêm as palavras técnica e tecnologia, entre outras tantas).
            Algumas constatações garantem a importância das manifestações artísticas nas sociedades humanas:
            .Todas as sociedades registram manifestações artísticas: desde a mais primitiva à mais sofisticada: do batuque primal e pintura corporal à vídeo-arte e web-art. A arte é produzida fatalmente: de uma forma cerâmica à decoração pictural ou incisa do mesmo artefato. O que explica essa coisa a mais que as sociedades praticam/cultivam é um chamamento íntimo, uma carência espiritual.
            Alguns procedimentos ditos artísticos se perpetuam ou evoluem muito lentamente. No caso do Ocidente, as formas, a partir dos gregos (que lançaram os fundamentos da Civilização Ocidental) evoluíram muito rapidamente. O ESTILO se caracteriza pela repetição de elementos formais nas várias manifestações artísticas e acabam sendo marca registrada de etnias, épocas, indivíduos-artistas: H. Wölfflin, teórico da arte dos mais importantes, justamente é quem fala em estilo étnico (o que justifica falarmos em arte da África Negra, do Islão, arte chinesa…); estilo de época (daí nos referirmos à escultura grega do período helenístico, arte da Renascença italiana, pintura impressionista etc); estilo pessoal, que define cada artista em particular (é óbvio o que há de particular na pintura de Van Gogh, entre outros tantos artistas de um estilo pessoal bem marcante: Leonardo da Vinci, El Greco, Amedeo Modigliani…).
            .ARTE: uma necessidade. Sim, a arte responde a uma necessidade de caráter psíquico, espiritual. Quando Roman Jakobson apresenta o seu modelo comunicacional com os fatores da comunicação verbal e cada uma das funções que os mesmos determinam, a Função Poética é apresentada como uma dentre as funções da linguagem, mas uma função que se caracteriza justamente por chamar a atenção da forma: os signos tendo a sua materialidade ressaltada (o pendor se dando para a mensagem ela-mesma - a coisa em sua materialidade.
            Arte é FORMA: sapateiem, gritem, esbravejem - forma é fundamental na Arte). Como corolário da referida teoria jakobsoniana (herdeira do Formalismo Russo, do qual Jakobson foi um dos representantes) podemos tirar o seguinte: todas as funções são importantes, pois respondem a necessidades específicas daqueles que estão envolvidos no processo de comunicação: daí que a função poética, respondendo a uma necessidade de caráter espiritual, é de fundamental importância, donde podemos concluir que a Arte como um todo - corporificada em todas as suas modalidades - é necessária. Vivemos provando a necessidade da Arte.
            .Todos consomem Arte. Ou melhor, todos a fruem (o verbo é FRUIR; daí temos a fruição e nós somos os fruidores). Todos consomem Arte, alguma forma-modalidade de Arte, Arte em algum nível, mesmo que obras de um repertório rebaixado (e aqui não entra a admirável arte naïf - ingênua). Acontece que sempre consideramos o que é produzido de melhor (Chega-se ao melhor pelas vias da comparação. Um artista necessariamente se insere numa dada tradição. Daí que a abordagem de sua obra se dará primeiramente em relação à tradição a que pertence; a seguir, sua obra será abordada com relação à produção de seus contemporâneos e, por último, uma sua obra em particular será cotejada com o restante de sua própria produção. Somente a partir disto é que poderemos tecer um juízo consistente sobre o artista em questão). Porém, há toda uma produção menor, barateada, que não interessa às antologias, aos críticos, historiadores, filósofos-estetas, mas que desempenha para os menos informados, para os de repertório menos sofisticado, o mesmo papel de atender a necessidades psíquicas.
            Consumimos arte mesmo que à revelia, pois não é necessário que se proceda a uma reflexão sobre o fenômeno artístico para fruí-lo. Quantas vezes, nesta paulicéia, não topamos com edifícios-verdadeiras-obras-de-arte que até paramos para admirar: Niemeyer, Paulo Mendes da Rocha, Rui Ohtake? Sem grande esforço, passamos a fruir tais obras. E admiramos o que não é utilitário na arquitetura, o que faz de um prédio uma abra-de-arte. Nem todos são artistas, porém todos podem desenvolver a sensibilidade até para apreciar as obras mais difíceis, aquelas de maior complexidade em sua elaboração.
            Arte não é expressão de sentimento. Arte tem a ver com sensibilidade. As sensações recolhidas por nós, nesse nosso estar-no-mundo, ainda não são o poema (parafraseando Fernando Pessoa): é necessário que esse "material" colhido pelo poeta-artista passe pelo crivo da racionalidade para que a obra aconteça (tendo o necessário domínio técnico, fruto de todo um longo aprendizado).
            Arte nada tem a ver com espontaneidade. Inspiração? Intuição? Nada vem do nada (EX NIHILO NIHIL). Se se tem repertório, as coisas acontecem: ninguém intui do nada; ninguém sonha grandes obras, se não consegue fazê-las quando acordado. A inspiração, para aqueles que têm talento e o know-how, nada mais é do que o momento de extema facilidade, em que tudo colabora para que a obra aconteça, já se disse. Por outro lado, não há aditivo que faça de um medíocre um grande artista. Quem faz, faz de cara-limpa, ou não, mas faria de qualquer maneira.
            A Arte corporifica-se nas obras-de-arte, as quais resultam de um  processo dialético em que entram em jogo sensibilidade e racionalidade. Toda grande obra requer alto grau de elaboração, todo um pensamento verbal ou não-verbal: vejam-se quadros de Alfredo Volpi e fragmentos das GALÁXIAS de Haroldo de Campos. Espontânea pode ser a reação de algém frente a uma obra ("Que que é isso?!" por exemplo). A obra sempre estará à espera de um intérprete que venha a lê-la de maneira satisfatória. Os signos - complexos sígnicos - estão à espera do leitor ideal.
            Há alguns anos, era bacana alguém se recusar a dar explicações sobre o próprio trabalho artístico, dizendo: "A obra fala por si!" E há quem continue a dizer a mesma coisa. Acontece que a obra não fala por si. A obra fala para um certo repertório. O signo desperta coisas na mente de alguém (o destinatário, o leitor, o decodificador, o intérprete), que poderá apenas pensar ou se expressar em palavras - oralmente ou por escrito.
            Na teoria peirceana do signo, fala-se, não propriamente de Significado, mas de Interpretante. O Interpretante peirceano é parte integrante do signo e se divide em três: Interpretante Imediato, que é tudo aquilo que o signo puder vir a despertar na mente do intérprete, é a interpretabilidade do signo. O Interpretante Dinâmico: é o desdobrar do signo naquilo que ele apresenta de interpretabilidade para alguém que, portanto, desencadeia o processo da Semiose (ação do signo); o Interpretante Dinâmico pode ser Emocional ("Que beleza!", por exemplo, já é um início de leitura); Energético (o esforço que se faz no sentido de se chegar a uma leitura satisfatória) e Lógico, quando já podemos fazer generalizações ("Trata-se de uma obra do universo do Barroco", por exemplo). Caso a Semiose se esgotasse, teríamos o Interpretante Final, que equivaleria à verdade; porém seu lugar será sempre o futuro. Daí não termos a possibilidade de esgotar a leitura de uma obra. Sempre sobrará algo para outros leitores. Por isto é que as obras nunca são lidas em definitivo: toda leitura, por melhor que seja, será sempre incompleta, mesmo que temporariamente satisfatória.
            As grandes obras são impregnadas de eternidade. Certas obras estão sempre a despertar interesse de sucessivas gerações de apreciadores. Há um halo de juventude que perpassa tais obras e é isto que faz com que nos interessemos por elas, em qualquer época. ARTE. OMAR KHOURI

 



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