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HUMANOS SERES
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JORGE LUIS BORGES

 

            Minha primeira saída do Brasil se deu tardiamente, em 1984, época em que eu já passara dos trinta. Em janeiro daquele ano resolvi ir até à Argentina, Buenos Aires, mais especificamente. Pois justamente nesta primeira viagem para o exterior, embora um exterior tão próximo, estive por duas vezes com aquele que era, então, o maior narrador vivo do mundo: Jorge Luis Borges.
            A aventura que foi localizá-lo na cidade mereceria um escrito à parte; entre outras coisas, o telefone de seu apartamento na Calle Maipú com a Marcelo T. de Alvear ainda se encomtrava no nome da mãe - Leonor Acevedo de Borges - pessoa que o acompanhou desde que ficou cego, tendo morrido aos 99 anos de idade.
            Bobagem, nas vezes que estive a sós com ele, ter evitado falar em visualidade na poesia e coisas mais que se referissem à visão, já que ele tratava do assunto cegueira com a maior naturalidade, tendo dado até conferência sobre ela. Além do mais, ia a cinemas, visitava lugares...
            Borges foi um grande prosador. Por detrás de uma aparência tradicional de narrativa, há  todo um trabalho envolvendo tramas surpreendentes, numa escrituração cheia de artifícios, o que chegava a exacerbar o ficcional da ficção (fingimento): o foco narrativo, o trânsito entre o sono/sonho e a vigília, a metalinguagem... Sua prosa possuía uma espécie, não de ritmo, como se entende o ritmo na poesia, mas uma respiração marcante. Daí que é fundamental lê-lo no original espanhol. Parece-me que seus tradutores para o Português não perceberam isso.
            Ficcionista acima de tudo, Borges elaborou em torno de si uma nuvem ficcional, a ponto de se ter duvidado mesmo de sua existência. Num belíssimo escrito Borges e Eu, ele chega a afirmar: "Vivo, eu me deixo viver para que Borges possa tramar sua literatura". Esse incrível escritor, que não escondia a paixão que tinha pelas enciclopédias (eu cheguei a ler verbetes para ele) trazia consigo um saber imenso, que reunia Ocidente e Oriente e elaborou uma obra além de admirável. O poeta não foi tão grande quanto o narrador e o comentador de Literatura e outras coisas mais, mas era no mínimo finíssimo.
            É óbvio que, já com idade bastante avançada e solitário momentaneamente naquele escaldante verão portenho, ele receberia qualquer pessoa, porém quem estava lá era eu e ansioso para ver o gênio. Tudo colaborou para que eu viesse a conhecer o autor de Ficciones, o homem que disse ter lido primeiramente em inglês o Quijote e, quando leu o texto espanhol, este lhe parecer uma obra mal traduzida!
            Guardo ainda, com cuidado, as cerca de trinta fotos que fiz dele naquela ocasião. OMAR KHOURI

 


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